A Fibromialgia e o Liquor

A Fibromialgia (FM) é uma síndrome dolorosa e complexa que ainda não possui uma definição exata. Isso ocorre em função do seu amplo espectro de sintomas, incluindo:

  • Dor generalizada;
  • Sensibilidade à pressão;
  • Fadiga;
  • Distúrbios de sono;
  • Rigidez muscular;
  • Disfunção cognitiva;
  • Distúrbios de humor, incluindo depressão;
  • Dificuldade de equilíbrio;
  • Fraqueza muscular;
  • Comprometimento funcional.

A condição pode estar associada à Síndrome do Intestino Irritável, Síndrome das Pernas Inquietas e várias outras comorbidades. Devido à sua grande variedade de sintomas e à sobreposição com múltiplos outros distúrbios, a Fibromialgia também é de difícil diagnóstico.

O diagnóstico da FM é atualmente realizado de forma subjetiva pelos médicos, e apenas um número limitado de parâmetros objetivos promissores foram propostos para melhorar a sua precisão. No entanto, nenhum deles foi avaliado o suficiente ou implementado na clínica.

Recentemente, análises proteômicas de biofluidos de indivíduos com fibromialgia identificaram biomarcadores potenciais. A análise direcionada de microRNA circulante, enzimas do metabolismo de purinas, citocinas e quimiocinas, bem como estudos de metabolômica, forneceram mais informações sobre as características da doença. Além disso, a FM pode estar associada à inflamação, influenciando a propagação da dor.

Nesse sentido, considerando-se que alguns dos sintomas da Fibromialgia têm origem no sistema nervoso central (SNC), a análise do líquido cefalorraquidiano (liquor) é uma forma promissora de avaliar possíveis alterações.

Um estudo publicado em 2019 na revista Journal of Proteomics avaliou um total de 77 amostras de liquor por espectrometria de massa, sendo 39 de pacientes com FM e 38 participantes de controles. As características demográficas não foram significativamente diferentes entre os grupos. A pesquisa foi realizada na Noruega e o diagnóstico de Fibromialgia se estabeleceu de acordo com os critérios do American College of Rheumatology (ACR).

Um total de 1.067 proteínas foram identificadas e quantificadas no líquido cefalorraquidiano; destas, utilizaram-se 299 para análise. Houve pequenas diferenças entre pacientes com fibromialgia e controles. Dez proteínas foram diferentemente expressas em pacientes com FM e controles, sendo quatro delas com distinções significativas.

A apolipoproteína C-III (APOC3) apresenta maior expressão em pacientes com fibromialgia do que em controles. A proteína de ligação à galectina-3 (LG3BP) também foi superior em FM. Já a ProSAAS (PCSK1) apresentou maior abundância relativa em pacientes com a doença do que em controles. Por outro lado, a Malato desidrogenase citoplasmática (MDHC) foi aproximadamente quatro vezes menor em indivíduos com FM, em comparação aos controles.

O significado do aumento das três primeiras proteínas ainda é incerto. O nível mais baixo da MDHC foi relatado no liquor em pacientes com dor crônica generalizada, uma condição semelhante à Fibromialgia, tornando essa proteína um alvo interessante para estudos posteriores.

Os dados supracitados sugerem que a magnitude das alterações na expressão de proteínas no líquido cefalorraquidiano é relativamente moderada, quando comparados pacientes com FM e controles sem dor. Contudo, o padrão multivariado de expressão proteica pode ser um bom preditor da doença, ou pelo menos refletir alterações bioquímicas no sistema nervoso central dos pacientes.

É importante ressaltar que tais alterações ainda não têm um valor diagnóstico na Fibromialgia, nem são úteis em termos clínicos. Porém, indicam que o liquor é um fluido com potencial utilidade na investigação futura de biomarcadores diagnósticos.

Bibliografia consultada: 

Khoonsari, P.E, Musunri, S., Herman, S., et al. (2019). Systematic analysis of the cerebrospinal fluid proteome of fibromyalgia patients. Journal of Proteomics, 190, p. 35-43. doi:10.1016/j.jprot.2018.04.014