O transtorno do espectro autista (TEA) é um transtorno do neurodesenvolvimento complexo, cuja fisiopatologia ainda não é completamente compreendida. A identificação de biomarcadores líquidos poderia não apenas auxiliar no diagnóstico, mas também oferecer insights sobre mecanismos biológicos envolvidos e possíveis intervenções terapêuticas.
Neste estudo publicado no Journal of Neurochemistry, os pesquisadores analisaram 203 proteínas no líquido cefalorraquidiano (LCR) e no soro de gêmeos com TEA e seus co-gêmeos menos afetados, permitindo avaliar a influência de fatores genéticos e ambientais nesses biomarcadores.
Os resultados apontaram alterações em proteínas associadas a vias imunológicas, especialmente citocinas e fatores de sinalização inflamatória. No LCR, a gravidade dos sintomas do TEA correlacionou-se negativamente com:
- CCL23 (Chemokine (C-C motif) ligand 23) – uma quimiocina envolvida na regulação da resposta imune e recrutamento de leucócitos.
- AGRP (Agouti-Related Protein) – um neuropeptídeo relacionado à regulação do apetite e da sinalização hipotalâmica.
- CHI3L1 (Chitinase-3-like Protein 1) – uma proteína envolvida em inflamação crônica e remodelação tecidual.
Já a proteína LITAF (Lipopolysaccharide-Induced TNF-alpha Factor), que modula a resposta inflamatória via ativação do fator de necrose tumoral (TNF-α), apresentou correlação positiva com a intensidade dos sintomas.
No soro, 15 proteínas mostraram correlação positiva com TEA, destacando-se as duas seguintes:
- BAFF (B-cell Activating Factor) – fator de ativação de células B, essencial para a maturação e sobrevivência dessas células do sistema imunológico.
- CSTB (Cystatin B) – um inibidor de proteases cisteínicas, envolvido na neuroproteção e na regulação da morte celular.
As análises intra-par de gêmeos indicaram que os níveis séricos de BAFF mantiveram associação significativa com a intensidade de sintomas autísticos, enquanto a CSTB foi a única proteína que permaneceu associada ao diagnóstico de TEA. No entanto, quando considerados apenas gêmeos monozigóticos (MZ), nenhuma dessas associações permaneceu significativa, sugerindo que a relação entre os biomarcadores e o TEA pode ser parcialmente explicada por fatores genéticos compartilhados entre os gêmeos. Por outro lado, a persistência da associação em gêmeos dizigóticos e na amostra geral reforça a hipótese de que fatores ambientais individuais, como exposições no desenvolvimento fetal ou na primeira infância, podem desempenhar um papel na modulação desses biomarcadores.
Conclusão e Perspectivas
Os achados reforçam a hipótese de que processos imunológicos desempenham um papel relevante no TEA e destacam o potencial de alguns biomarcadores liquóricos para o manejo diagnóstico e terapêutico do transtorno.
No entanto, há necessidade de novos estudos que avaliem sua especificidade para TEA e seu valor prognóstico. Até o momento, nenhum biomarcador encontra-se validado para a avaliação e manejo destes pacientes.
Referência:
Smedler E, Kleppe J, Neufeld J, Lundin K, Bölte S, Landén M. Cerebrospinal fluid and serum protein markers in autism: A co-twin study. J Neurochem. 2021 Aug;158(3):798-806. doi: 10.1111/jnc.15338. Epub 2021 Apr 5. PMID: 33675537.