Manifestações neurológicas da Doença de Chagas

A doença de Chagas (DC) é causada pelo protozoário Trypanosoma cruzi (T. cruzi) e transmitida por vetor, por via oral, pela placenta e por transfusões e transplantes. Afeta aproximadamente 6-8 milhões de pessoas no mundo, sendo endêmica em 21 países. Cerca de 20-30% dos pacientes com DC crônica apresentam comprometimento cardíaco e/ou gastrointestinal.

O envolvimento do Sistema Nervoso Central (SNC) durante as fases aguda e crônica da DC humana tem sido relatado. A meningoencefalite é descrita com mais frequência em crianças durante a doença aguda, enquanto que na fase crônica a neurite se relaciona com comprometimento sensorial – relatado em até 10% dos pacientes.

Demência, confusão, encefalopatia crônica e déficits motores e sensoriais são menos comuns. Indivíduos infectados pelo vírus HIV, transplantados e imunossuprimidos por outras causas frequentemente apresentam reativação do parasita, com Meningoencefalite e abscessos cerebrais.

Manifestações clínicas na infecção aguda

Um quadro de Encefalite pode ocorrer durante a fase aguda da infecção. Nesses casos, é frequente o aumento da concentração de proteínas e leucócitos no líquido cefalorraquidiano (liquor), além da identificação de tripomastigotas do T. cruzi.

As manifestações clínicas incluem alterações cognitivas, cefaleia, mioclonias, alterações de coordenação, crises convulsivas, letargia e mudanças de humor. A Encefalite ocorre em 5-10% dos pacientes com infecção aguda, sendo mais frequente em crianças com menos de 2 anos de idade, uma faixa etária com alta mortalidade. A Meningoencefalite decorrente de infecção congênita também pode ocorrer.

Manifestações clínicas na infecção crônica

Demência e déficits sensoriais e motores foram relatados em pacientes com infecção crônica pelo T. cruzi. Testes cognitivos mostraram desempenho inferior nesse grupo em comparação com controles saudáveis. O aumento de citocinas pró-inflamatórias no cérebro causa sintomas depressivos e alterações cognitivas.

O SNC é o local mais frequente de reativação de T. cruzi em pacientes imunossuprimidos infectados pelo HIV. Nesses casos, há danos ao tecido cerebral relacionados ao aumento da expressão de IL-17 ou um quadro de Meningoencefalite com tripomastigotas abundantes no liquor.

Diagnóstico e a importância do LCR

O diagnóstico da Doença de Chagas aguda é feito pela detecção de formas móveis do tripanossoma por meio de exames diretos. Pacientes com sinais e sintomas de Meningoencefalite devem ser submetidos à punção lombar. O liquor mostra pleocitose leve com predominância de linfócitos e aumento nos níveis de proteínas.

A presença de formas móveis de tripomastigotas após centrifugação do líquido cefalorraquidiano pode ser demonstrada. Os parasitas também podem ser observados em esfregaços corados com Giemsa. O mesmo procedimento é recomendado para recém-nascidos sintomáticos de mães com fatores de risco para a Doença de Chagas.

A infecção crônica por T. cruzi geralmente é diagnosticada pela detecção de anticorpos imunoglobulina G. Os testes usados incluem hemaglutinação indireta, aglutinação direta, fixação de complemento, imunofluorescência indireta, ensaios imunoenzimáticos e ensaios de radioimunoprecipitação. São necessários dois testes positivos diferentes para confirmar o diagnóstico. Os parasitas podem ser detectados no sangue por métodos indiretos, como culturas de sangue ou xenodiagnóstico.

Estudos de condução nervosa ou eletroencefalogramas não são recomendados em pacientes sem sinais ou sintomas de comprometimento neurológico. O manejo de indivíduos com manifestações neurológicas consiste em medidas de suporte e alívio sintomático. Pacientes com infecção crônica por T. cruzi devem ser tratados com benznidazol ou nifurtimox, mas não há consenso quanto ao tratamento de pessoas com infecção por T. cruzi assintomática de longa data.

A técnica de PCR vem sendo utilizada em amostras de DNA obtidas de uma variedade de fluidos e tecidos, inclusive o liquor, mostrando bons resultados. 

Bibliografia consultada

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Senne Liquor Diagnóstico

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Diretor Técnico-Médico: Carlos Senne

Médico: CRM-SP 16618

Patologista Clínico: RQE-SP 44360